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Nos Recusamos a Pagar – Um Manifesto

Somos milhares de inquilinos e inquilinos que esta crise está deixando sem renda. Não podemos pagar o aluguel da casa onde moramos ou da empresa ou escritório onde trabalhamos. Leia nosso manifesto.

Não dá para negar que passamos por um momento estranho e delicado. Existe uma doença nova e mortal diariamente fazendo novas vítimas e os governos, do Brasil e do mundo, se debatem para evitar o colapso social, regular a economia e, quem sabe, salvar vidas. De todo o mundo, as notícias sobre o número de vítimas e as estratégias para sobreviver à pandemia não param de chegar. Espanha ocupou hotéis com pessoas sem casa, El Salvador suspendeu a cobrança de contas básicas e o Irã determinou a liberdade de mais de 70 mil pessoas encarceradas expostas a aglomeração e, logo, ao vírus.

Enquanto isso, no Brasil, distintos níveis governamentais reafirmam teorias maníacas sobre o vírus (veio do espaço, gripezinha…) e estimulam o fortalecimento do Estado policial de controle e de uma teocracia evangélica. As medidas de auxílio, em especial às pessoas mais pobres, são incipientes ou dependem de cadastramentos absurdos, e todo o sistema de governo bate cabeça sobre como lidar com os impactos da pandemia.

Apenas em uma coisa concordam: salvar a tal economia. Como se esta fosse uma princesa encerrada em um castelo, e as instâncias de governo seu príncipe encantado, mobilizam-se para salvar a economia com bilhões de reais. Os primeiros a serem socorridos de Covid19 foram os bancos. Mas as mais de 13 milhões de pessoas que moram em favelas no Brasil não sabem ainda como farão com as contas que sempre chegam, independente de sua saúde. Mais de 11 milhões de casas em São Paulo são alugadas, como serão pagos os aluguéis?

Muros entre países, muros na moradia, muros na saúde, muros na educação, muros nos cultos e culturas, muros no público. Antes mesmo da pandemia já era possível observar o empobrecimento geral das pessoas, o aumento no número de pessoas em trabalhos precários e autônomos, e centenas de vidas morando nas ruas.

Mas o vírus não vê os muros que nós vemos. Qual é a ilu$ão que mantém esses muros em pé?

Assim, nos perguntamos: o vírus que dará origem a uma crise econômica, ou a constante crise em que vivemos é que torna possível que uma doença cause tamanho número de mortes? Se houvesse acesso universal à saúde, moradia e alimentação, o Coronavírus faria tantas vítimas? Nosso verdadeiro mal, o pior vírus, é o que nos obriga a trabalhar até a morte e a pagar por todos os aspectos de nossa vida.

Assim, para que todas as pessoas estejam seguras é preciso garantir que todos e cada um de nós estejamos alimentados, seguros, em nossas casas. É preciso que quem não tem casa possa ter – ainda que nesse momento temporariamente – um teto seguro para se abrigar. Que as pessoas que vivem em aglomerações, como as pessoas presas, maioria sem julgamento e por crimes leves no Brasil, possam responder o processo em suas casas, como tantos políticos que roubam do coletivo têm direito. É preciso garantir imunidade coletiva para todas e todos.

Desafiando a fortaleza construída em cima de nossas vidas e que nos leva somente à morte, nos recusamos a pagar a conta de uma crise que é maior que o vírus que nesse momento extermina as pessoas mais pobres. Nesse momento de vulnerabilidade, devemos reter o dinheiro de nossos aluguéis e contas, assim como bancos e governos podem arbitrariamente escolher através de sua distribuição hipócrita de riquezas quem vive e quem morre. Nos recusamos a pagar o que nunca deveria ter tido preço.